Por Que Pedir Aos Santos Se Eu Posso Pedir Diretamente A Deus? A interrogação sobre a pertinência de solicitar a intercessão dos santos, em detrimento de uma oração direta a Deus, desvela uma questão profunda que toca a essência da teologia cristã e da compreensão da natureza divina, bem como do propósito da criação e da dinâmica da graça e da salvação.
A resposta a essa indagação, longe de ser simples ou superficial, requer um mergulho nas profundezas da sabedoria cristã, tal como articulada por teólogos eminentes, como Santo Tomás de Aquino, e refletida na tradição viva da Igreja.
“A Bondade Divina e a Criação”:
A Bondade Divina e a Criação No coração da doutrina cristã jaz a convicção de que Deus, em Sua essência infinitamente boa, não se contentou em permanecer em solitária perfeição.
Pelo contrário, motivado por um impulso de generosidade que é inseparável de Sua natureza, Deus escolheu criar. “É da essência da vontade comunicarmos a outrem o bem que possuímos”, escreve Santo Tomás de Aquino na “Suma Teológica”.
Assim, a criação não é um ato de necessidade ou vaidade divina, mas um gesto de amor, uma extensão da bondade de Deus. A Multiformidade da Criação Deus, em Sua sabedoria, optou por uma criação diversificada.
A Multiformidade da Criação
Uma única criatura, por mais maravilhosa que fosse, não poderia refletir plenamente a infinitude de Deus. Portanto, Deus criou uma miríade de seres, cada um manifestando aspectos distintos de Sua bondade e perfeição.
A Multiformidade da Criação Essa escolha por uma criação multiforme não foi arbitrária, mas sim um reflexo da plenitude e da riqueza da divindade. “Com mais perfeição participa da divina bondade e a representa todo o universo do que outra criatura qualquer”, afirma Santo Tomás. Tentar organizar uma lista de 40 nomes todos iguais em ordem alfabética é impraticável; a organização necessita de diversidade.
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Além disso, a forma como se escolhe ordenar algo pode dizer muito sobre a compreensão de quem organiza. Por exemplo, uma pessoa que não domina a leitura pode decidir ordenar os livros em uma prateleira pelo tamanho ou pela cor deles, em vez de pelo título ou autor.
A Interdependência Como Expressão da Vontade Divina
A Ordem e a Hierarquia na Criação Neste universo vasto e diversificado, Deus estabeleceu uma ordem. Cada criatura, desde a matéria inanimada até os anjos, ocupa um lugar específico em uma hierarquia que, de certa forma, reflete a própria hierarquia celestial. Essa ordenação não é mera disposição de poder, mas um meio pelo qual a bondade de Deus é manifestada e compartilhada.
A desigualdade entre as criaturas, longe de ser um defeito, é um veículo para a expressão da sabedoria divina: “o que falta a uma, para representar a divina bondade, é suprido por outra”.
A Interdependência Como Expressão da Vontade Divina Além de estabelecer uma ordem, Deus criou as criaturas para serem interdependentes. Este design não é uma limitação das criaturas, mas um reflexo da própria inter-relacionalidade dentro da Trindade. Assim como as Pessoas da Trindade se relacionam entre si em amor e doação mútua, as criaturas são chamadas a uma existência de dependência recíproca e ajuda mútua.
A Função dos Santos e dos Anjos
A Função dos Santos e dos Anjos Neste cosmos ordenado e interdependente, os santos e os anjos ocupam papéis de particular importância. Os anjos, criaturas puramente espirituais e mais próximas da perfeição divina, são designados como mensageiros e executores da vontade de Deus, ajudando a guiar e proteger as criaturas materiais em seu caminho para Deus.
Os santos, por outro lado, são aqueles que, tendo vivido vidas de notável santidade na Terra, continuam, mesmo após a morte, a interceder por nós junto a Deus. Essa capacidade de intercessão transcende a morte, como São Paulo nos assegura: “nem a morte… poderá nos separar do amor de Deus”. A Intercessão dos Santos como Cumprimento da Caridade Divina Ao nos voltarmos para os santos, buscando sua intercessão, não estamos minimizando nossa relação direta com Deus.
Ao contrário, estamos participando de uma economia de salvação que é profundamente relacional e intercessional por natureza. Pedir a intercessão dos santos é reconhecer e honrar a maneira como Deus estruturou a realidade, promovendo uma comunhão mais profunda dentro do Corpo de Cristo.
É um ato de humildade e amor, reconhecendo que, assim como dependemos uns dos outros em nossa existência terrena, nossa vida espiritual também é enriquecida pela ajuda e pelo suporte dos que estão mais perto de Deus.
A Intercessão dos Santos como Cumprimento da Caridade Divina
A Mediação Única de Cristo e o Papel dos Santos Argumenta-se, por vezes, que recorrer aos santos contraria a mediação única de Cristo. Contudo, essa objeção falha em reconhecer a distinção entre a mediação salvífica, que pertence somente a Cristo, e a intercessão, que é um chamado compartilhado por todos os fiéis.
Ao nos voltarmos para os santos, buscando sua intercessão, não estamos minimizando nossa relação direta com Deus. Ao contrário, estamos participando de uma economia de salvação que é profundamente relacional e intercessional por natureza.
Pedir a intercessão dos santos é reconhecer e honrar a maneira como Deus estruturou a realidade, promovendo uma comunhão mais profunda dentro do Corpo de Cristo.
Intermediários humanos(confissão)
É um ato de humildade e amor, reconhecendo que, assim como dependemos uns dos outros em nossa existência terrena, nossa vida espiritual também é enriquecida pela ajuda e pelo suporte dos que estão mais perto de Deus.
E assim, DEUS ESTABELECEU INTERMEDIÁRIOS entre ele e os homens. Pois Deus quer agir mediante a criatura. Não por deficiência sua, mas por abundância da sua bondade, para que uma criatura faça o bem a outra.
Cristo, como ponte entre Deus e a humanidade, nos une em Seu Corpo Místico, permitindo que participemos uns na vida dos outros de maneiras que refletem a bondade e a providência divinas.
Intercessão dos amigos de Jó
Por essa razão, Deus instruiu os companheiros de Jó a buscar sua mediação para receberem graça: “Vão até meu servo Jó, apresentem um sacrifício por vocês mesmos; e meu servo Jó intercederá por vocês. Eu aceitarei sua intercessão a favor de vocês, para que não sejam marcados por sua insensatez” (Jó 42,8).
Contudo, a segunda forma, a qual é a intercessão, é algo que todos os homens podem e devem praticar. Pois os intercessores atuam por meio de Cristo, que serve como mediador, unindo-se a Ele como uma ponte, e, assim, formando um único corpo em Cristo.
Antes que argumentem que Deus só permite a intercessão entre os vivos, devemos lembrar que São Paulo nos afirmou que nem a morte pode nos afastar do amor de Deus (Rm 8,38-39). Portanto, mesmo após a morte, os santos no céu permanecem intercedendo em favor daqueles que estão na terra.
Também não contradiz a intercessão dos santos o fato de a Bíblia afirmar que Cristo é o único mediador entre Deus e os homens. Pois existem duas formas de mediação: uma que busca a salvação do pecador e outra que visa fortalecer os laços fraternos.
Longe de ser uma prática espiritual opcional ou secundária, pedir a intercessão dos santos está profundamente enraizado na compreensão cristã de Deus, da criação e da comunhão dos santos. É uma expressão da rica tapeçaria de relações que Deus teceu na criação, um reconhecimento da ordem divina e uma participação na caridade que flui do coração de Deus.
Também possui uma origem orgulhosa, pois não reconhece a necessidade de submeter-se à criatura. Contudo, é o próprio Deus quem nos moldou dessa maneira, para que possamos praticar a caridade. Por conseguinte, por que recorrer aos santos se podemos dirigir nossas preces diretamente a Deus? Porque solicitar a intercessão dos santos é, na verdade, cumprir a vontade de Deus.
Assim, ao nos voltarmos para os santos em oração, estamos, de fato, nos alinhando mais estreitamente com a vontade de Deus e com o desígnio amoroso que Ele tem para toda a criação.
